UN
EX-NUMERARIO BRASILEÑO
EU, 23 de enero de 2005
En español
Fui membro do Opus Dei de 1981 a 1997 na cidade de São
Paulo, Brasil. Eu era numerário. (Estou tentando não
me afetar com o que estou escrevendo. Mas basta olhar o tempo
investido nessa experiência para se ver que passei MUITOS
anos envolvido nisso. E isso é forte: dos 16 aos 34.
Minha juventude inteira...)
Estou escrevendo porque acho que agora consigo falar do assunto.
Após 7 anos. Agora que tenho 40. Há 7 anos sonho
quase todos os dias com meus tempos lá. Escrevo porque
quero fazer o que todos os que escrevem tentam: curar-me através
dessa catarse...
Há 7 anos simplesmente deixei o centro onde morava
e nunca mais me vi capaz de ler, contatar, falar sequer sobre
aqueles tempos, exceto para minha esposa. Agora dei a mim
mesmo o direito de falar sobre o tema mas apenas uma
vez.
Gostaria muito de me identificar e de falar os nomes. Mas
alguma coisa está me impedindo. O fato é que
aos 16 anos entrei para a Obra. Aos 17 fui morar no Centro
de Estudos (porque já era universitário). Meu
pai se opôs e estava recém recuperado de sua
segunda operação no coração. Quando
me mudei, ele nunca mais foi o mesmo. Meu irmão seguiu
meu exemplo e saiu de casa para tocar sua vida. E o equilíbrio
instável da minha família se quebrou para sempre.
Minha irmã mais nova cresceu sem irmãos por
perto.
Meus dois anos no Sumaré foram horríveis para
mim, pois me sentia sozinho. Tudo era frio. Me lembro do dia
em que um padre que morava por lá me sugeriu que me
agasalhasse porque estava lívido.
Fui transferido para um centro para jovens na mesma cidade.
Queria muito ir para outra, mas acho que era uma pessoa insegura
e tristonha. Foi assim que fiquei por 9 anos por lá.
Passei de ser o rapaz recém-chegado do Centro de Estudos
para o mais velho que tinha que dar exemplo. Tive direito
até a um quarto individual. Mas nunca tive a chance
de ir para outra cidade, de ser de alguma forma reconhecido.
Mais tarde, me enviaram para um centro de gente mais velha.
Aí eu era o mais novo. Toda a vivacidade, vibração
e variação de pessoas novas (adorava fazer viagens
para acampar, caminhar no campo, etc.) foram substituídas
por um ambiente de pouca convivência, de pessoas meio
passadas. E de gente esquisita. Também sempre fui muito
de me sentir bem ajudando outras pessoas, tanto que me dava
bastante prazer as idas àquela escola da Pedreira,
no subúrbio da cidade. Enfim, ao chegar ao novo centro,
no ano de 94 estava deprimido, triste, sentindo que não
havia muito sentido para minha vida. Mas nunca me permiti
colocar a possibilidade de sair do Opus Dei.
Em abril de 94 morreu meu pai. Em janeiro havia me mudado
ao novo centro. Exatamente quando começava a me sentir
com um mínimo de liberdade interior para me permitir
sentimentos verdadeiros com relação a ele, ele
morreu. Do coração. Na quinta feira havia me
telefonado na empresa e eu o cortei, dizendo que depois ligava
porque estava ocupado. No domingo, à tarde, me chamou
o vizinho de meus pais para avisar. E eu não havia
ligado para ele nesse meio tempo.
Em junho comecei a comentar aos diretores do centro que não
conseguia cumprir tão bem minhas obrigações,
as normas de piedade. Depois de algum tempo, me diagnosticaram
uma depressão (quem falava comigo era um médico).
Pela primeira vez, encontrei uma oportunidade de dar atenção
às minhas necessidades: tomava Prozac e começava
a sentir coisas estranhas. Uma espécie de falta de
vontade de cumprir minhas obrigações e, ao mesmo
tempo, uma necessidade de tratar de mim mesmo. Lembro-me que
tudo começou durante a Copa do Mundo. Minha única
motivação estava no trabalho. O resto, se misturava
numa grande nuvem cinza.
Fui promovido, viajei para a Europa para fazer um curso de
inglês. Havia aprendido a dirigir havia pouco.
Continuei tomando remédios em 94, 95 e 96 e 97! Quando
minha mulher me conheceu, algum tempo após sair do
Opus Dei, ainda tinha remédios em meu criado-mudo,
porque o médico (diretor) havia diagnosticado (juntamente
com outro médico espanhol da Clínica de Navarra)
que deveria ter alguma instabilidade causada por algum processo
químico. Deram-me remédios usados por pessoas
com epilepsia.
Em dezembro de 1996 fui demitido: era visto como uma pessoa
esquisita e difícil. Após três meses,
apareceram duas oportunidades de emprego. Após consultar
o diretor, decidi por sua orientação, pela oportunidade
mais interessante: aquela que me levaria a viajar várias
vezes para outro estado.
Naquele período, recomecei, aos 33 anos, a ter poluções
noturnas e meus sonhos se povoavam por imagens sensuais. Como
tinha que viajar várias vezes para outro estado, fiquei
uma primeira vez num centro, depois no hotel 5 estrelas, juntamente
com meus colegas de trabalho. Na terceira viagem, já
fiquei sem muitos remorsos num hotel, uma vez que o havia
feito outra vez. Assim fomos até setembro. Nesse período,
tinha enormes dificuldades de cumprir as normas de piedade.
Quando estava no centro, assistia à missa mas não
me confessava nem comungava.
Alguma coisa acontecia comigo e não conseguia saber
o que era. Minhas dificuldades em me ligar de novo naquilo
que havia sido minha vida durante a fase mais adulta me surpreendia.
Mas aquele pessoal ainda era minha família. No centro
onde morava, havia uma pessoa com uma depressão tão
profunda, que havia se tornado um gordo simpático,
mas bastante alheio ao mundo, não o bastante para sentir
uma profunda gratidão e fidelidade ao Opus Dei. Eu
gostava dele, porque era simples. Havia outras pessoas de
quem gostava mais ou menos.
Creio que meus sentimentos, ao não cumprir com as
obrigações, ao assistir um programa na tv do
hotel que era erótico, enfim... ao fazer as coisas
que me davam vontade... era a de um menino travesso que, simplesmente,
não conseguia se controlar.
Retornei de uma viagem em setembro. Lembro-me de ter chegado
à hora da reunião de depois do jantar em que
todos batiam um papo. Antes de eu jantar, o diretor me chamou
em sua sala e me disse que, após discutir o tema com
o diretor geral do Opus Dei no Brasil, tinham decidido me
dispensar da vida em família. Estava causando
escândalo ao numerário com depressão.
Minha reação foi muito visceral. Aliás,
tenho feito um trabalho danado para poder ouvir meus sentimentos,
respeitá-los: é esquisito, porque parece que
estou aprendendo a falar algum idioma desconhecido que é
ao mesmo tempo familiar.
Naquele exato momento, a única coisa que pude fazer
após ouvir que tinha até sábado (era
quarta à noite) para me mudar (para onde, se passei
minha vida inteira me esquivando de minha família?!),
foi simplesmente responder que havia entendido. Saí
da sala com passos trôpegos, um frio intenso dentro
de mim.
Estava simplesmente pasmo. Na hora em que mais precisava
de ajuda, em que pedia ajuda com meus próprios atos,
era liberado da vida em família. E para
onde iria, após tantos anos longe de minha família?
Senti-me profundamente rejeitado. Não conseguia pensar
em nada a não ser pegar minhas coisas e ir embora imediatamente.
Arquitetei um plano.
No dia seguinte, pedi um carro emprestado na empresa (haviam
me oferecido um dia antes), cheguei ao centro à noite,
quando já dormiam, tendo o cuidado de deixar o veículo
num estacionamento. Antes de me deitar, juntei todas as minhas
coisas, aquelas que podia carregar. Acordei às 5 horas
da manhã, levei para baixo as minhas coisas, trouxe
o carro do estacionamento e fui embora.
Me sentia em plena estepe siberiana. Mas apenas uma coisa
estava clara: se aquilo não era para a alegria
e a tristeza da parte de lá, não seria
da parte de cá. Só isso. Sem teorias, sem justificativas
ou explicações.
A primeira noite foi a coisa mais terrível. Me hospedei
em um hotel de quinta para sexta. Sexta à noite, fui
para a casa da minha irmã no interior. Segunda de manhã,
aos 220 por hora, fui ao trabalho e consegui que me mandassem
para a empresa no outro estado. Uma seqüência de
fatos me colocaram nos Estados Unidos uma semana depois por
um período de 1 mês. A seguir, fui convidado
a trabalhar no outro estado e minha vida tomou seu rumo.
Nunca falei à minha família que havia saído.
Como disse, tenho sonhado com meus tempos por lá quase
todos os dias. Ainda por lá, sempre quis que meu desenvolvimento
profissional se desse sem nenhuma vinculação
com o Opus Dei. Por isso, nem precisei me afastar de pessoas
no meu dia a dia. Como odiava certo linguajar interno, as
gírias e o espírito de grupinho, não
foi difícil purgar meu vocabulário dos termos
pouco usuais que usávamos por lá. Ainda freqüentei
a missa por um tempo, cada vez com menos freqüência.
Atualmente, simplesmente existo, sem existencialismo. Aguardo
o momento em que esteja pronto para lidar com minha espiritualidade
de novo.
O que quero? Simplesmente desejo viver e ser feliz. Disse,
no começo, que esta seria minha última manifestação.
Mas, ao escrever este relato, percebi que vou precisar me
expressar mais algumas vezes até que esteja pronto
a me separar desta pele que ainda está presa em mim.
Queria muito ser feliz, viver minha vida. E é isso
o que estou tentando. Aprendendo sentimentos que não
experimentei, convivendo com pessoas que não permitia
conhecer, gostando delas, gostando de mim.
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